quarta-feira, 2 de abril de 2014

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37ª Entrevista: Nuno Nepomuceno (escritor português)


Nuno Nepomuceno

Nuno Nepomuceno nasceu nas Caldas da Rainha em 1978. Foi aluno na Universidade do Algarve onde se licenciou em Matemática. Estreou-se como escritor com a obra “O Espião Português” em 2012 e foi com este livro que venceu a 1ª Edição do Prémio Literário Book.it. Encontra-se, atualmente, a trabalhar no segundo volume desta trilogia.
  
Qual é a sua nacionalidade: Portuguesa
O seu Filme favorito:  Contacto
O seu Livro favorito: Os Pilares da Terra
O seu Anime favorito:  Bleach
O seu Manga favorito: Não tenho.
O seu Espetáculo favorito: Cirque du Soleil
A sua Série de televisão favorita: Lost
  
Como é que, sendo uma pessoa ligada ao mundo dos números, se rendeu ao encanto da escrita?
Foi um pouco ao contrário. A leitura acompanha-me desde muito pequeno. Passei a infância numa aldeia e o único recurso que tinha à minha disposição era uma biblioteca itinerante da Gulbenkian. Recordo-me que ficava muito zangado porque o motorista nunca me deixava escolher os livros, mas acabava sempre por ir esperar a carrinha todas as semanas. Depois, os meus pais mudaram-se para o Algarve e aí, já tive acesso a uma biblioteca municipal. Li todas as coleções juvenis disponíveis naquela altura, como Os Cinco, a Patrícia, Os Irmãos Hardy e Uma Aventura. O interesse foi crescendo e agora frequento livrarias com assiduidade. Sou algo reservado, calado, e um livro é sempre uma excelente companhia, além de nos permitir viver emoções e aventuras diferentes das nossas. Acho mesmo que é isso que mais me atrai. A formação em Matemática acabou por surgir em paralelo. Nunca foi algo a que aspirasse, mas os bons resultados que tive enquanto aluno, acrescidos à perspetiva de emprego, fizeram-me tomar essa opção. Assim que terminei o curso, acabei por enveredar por outra área, na qual ainda trabalho hoje em dia. A escrita é um desejo antigo, decorrente do gosto pela leitura. Contudo, estive sempre consciente do quão difícil é a um autor português afirmar-se e tornar-se autossuficiente no nosso mercado. Por isso, resolvi aguardar até conseguir ter a minha vida minimamente estável e organizada. Só depois é que surgiu O Espião Português. Não acho que a minha formação científica me prejudique sobremaneira. Aliás, até ajuda. A Matemática estruturou-me o raciocínio e o nível de abstração que lhe está subjacente também pode ser útil na escrita.

Porque decidiu estrear-se como escritor com uma história de espionagem, um estilo tão poucas vezes visto entre os escritores portugueses?
Essa foi exatamente uma das razões. É verdade que somos um país pequeno e com algumas singularidades, mas sempre achei um pouco estranho importarmos tanta literatura, em especial a chamada mais comercial, como fantasia ou policiais. Por isso, pareceu-me que a espionagem seria de alguma forma um nicho de mercado, caso um dia decidisse fazer uma tentativa séria na área. Não fui precursor, pois existem alguns autores nacionais com carreiras bem-sucedidas em produtos semelhantes, como são os thrillers, embora o que queria fazer fosse algo distinto. Gosto muito de espiões e afins e sentia-me algo à vontade, já que era o género que consumia com maior avidez, quer em termos literários, cinematográficos ou televisivos. Trata-se de um mundo muito apelativo e carismático porque coabita com segredos, ação e sedução, o que faz o leitor sonhar e imaginar. Daí ter arriscado. Claro que a diferença tem o seu preço. Numa conversa recente com a minha editora, esta confessou-me não saber o que esperar do público quando colocado perante uma história e um estilo tão singulares. Tenho a noção de que, numa primeira instância, as pessoas sentem-se curiosas em relação a um livro de espionagem escrito por um autor português, mas também pouco confiantes. Não vêm como será possível idealizar algo deste tipo por cá. Depois de lerem o livro, mudam de opinião.

A ação em “O Espião Português” desenrola-se em diversas cidades europeias em edifícios históricos. O Nuno conseguiu descrevê-los com grande detalhe! Visitou pessoalmente cada um desses locais para conhecê-los tão bem?
Assim seria desejável, mas confesso que não. Alguns dos locais onde decorre a ação são demasiado caros ou simplesmente pouco inacessíveis. Falo do hotel Westin Excelsior, em Roma, e do Palácio da Europa, em Estrasburgo, respetivamente. Estocolmo e Viena, conheço. Usei algumas das atrações que visitei e criei a história em torno delas, embora ocasionalmente tenha recorrido a outras alternativas. Foi o caso do clube noturno na vizinhança do complexo de Hofburg. Nunca lá estive, embora exista, tal como todos os cenários descritos no livro. É nesta altura que entra a pesquisa. Começo por guias ou revistas de viagens e normalmente acabo em sítios oficiais de turismo. Disponibilizam muita informação e oferecem alguma fiabilidade. Depois, tento sempre cruzar mais do que uma fonte para ter a certeza de que não estou a incorrer em erros. O resto, é trabalho.

Qual foi o feedback dos seus leitores sobre esta sua estreia?
Felizmente tem sido muito positivo, ainda mais do que estava à espera. Disponibilizei um endereço de email na minha página oficial na internet através do qual os leitores são convidados a contactarem-me. Tanto este como a página do Facebook têm sido ferramentas preciosas. Os leitores têm destacado sobretudo o aspeto emocional e gráfico da história e revelam-se muito interessados em relação aos próximos volumes. Dizem que sabe a pouco, apesar de serem mais de trezentas páginas, e normalmente dão-me os parabéns. Não me posso queixar. Todos têm sido muito simpáticos comigo, mais do que mereço.

Uma trilogia é sempre uma grande responsabilidade! O que foi mais difícil para si: escrever o primeiro livro ou criar a sua continuação?
Ainda não consigo dizer muito bem, porque correspondem a duas fases distintas da minha vida. O Espião Português começou a ser escrito em 2003 e só ficou concluído em Janeiro de 2011. Tratou-se de uma processo longo, com paragens extensas e bastantes avanços e retrocessos pelo meio. Eu escrevia quando tinha tempo e me apetecia, sem ninguém o saber, recusando-me a colocar um prazo ou um objetivo no projeto. Por isso é que nunca contei a ninguém, nem sequer à minha família. Era algo só meu. Era o meu livro, com a minha história, os meus elementos e as minhas personagens. Quando me comecei a aproximar da conclusão e percebi que tinha algo especial em mãos, então pensei em publicar. Acho que essa foi a parte mais penosa de todo o processo. O livro estava terminado e foi sucessivamente rejeitado até eu ter vencido o Prémio Book.it. Tinha-me esforçado e acreditado tanto, e durante um ano e meio só ouvi não. Com o segundo volume, tem sido diferente. Decorrente de tudo o que tem envolvido O Espião Português, ganhei alguma experiência e tenho tentado aprender alguma coisa com ela. Estou mais maduro e consigo gerir o meu tempo e frustrações de uma forma mais positiva. A noção que tenho do contacto com o público é que conquistei alguns leitores e a dificuldade maior tem sido essa, não os desiludir, não defraudar expetativas e estar à altura da responsabilidade. Outro desafio, tem sido a continuidade. Quero continuar a conquistar as pessoas e para isso não lhes posso pedir que comprem o primeiro livro para que possam compreender e apreciar o segundo. Daí ter criado novamente uma história com início, meio e fim. Sim, estou a escrever uma série de três livros. Mas cada um dos tomos tem identidade própria e poderá ser lido de forma independente. E depois, tenho ainda de lidar comigo. Sou demasiado autocrítico e nunca fico integralmente satisfeito com o meu trabalho. Ainda assim, tenho um sentimento muito positivo em relação ao segundo volume. Estou contente em relação ao que está feito e algo ansioso para que todos o possam ler.

O que podem os fãs de André Marques-Smith, o protagonista de “O Espião Português”, esperar do próximo livro?
O novo livro assenta no trinómio dúvida-confiança-traição. O fim de O Espião Português deixou o André numa situação peculiar. A sua vida mudou muito ao descobrir a verdade e ele terá de decidir em quem é que pode ou não confiar, o que no mundo dos espiões não é nada fácil. O mesmo irá acontecer no seio da fação rival, a Dark Star, que continuará a lutar contra o André e os colegas pela posse do projeto. O sindicato do crime, como eu lhe chamo, tem dois operacionais novos e neste volume vamos perceber melhor como é o seu funcionamento interno e como é que estas pessoas se vão encaixar lá dentro. É, por isso, um livro mais denso e negro do que o primeiro. Por outro lado, espero que consiga traduzir o meu próprio amadurecimento e evolução. Alguns dos elementos que vêm do primeiro volume e que são transversais a toda a trilogia vão manter-se, como a pluralidade de cenários, a profundidade emotiva das personagens e da história, ou o estilo narrativo. Mas existirão também algumas diferenças. Pela primeira vez, parte da ação irá decorrer fora da Europa, embora esta seja maioritariamente repartida entre Lisboa e outra capital, com passagens esporádicas por outros locais. É, de algum modo, um livro com bastante dualidade, a começar pelo protagonismo. O André terá de disputar esse papel com outra personagem que já é familiar ao público, mas que foi intencionalmente pouco desenvolvida por mim. Aqui, ficaremos a conhecê-la melhor. Quem é, qual o seu passado, e como marcará o futuro da trilogia. Aliás, tratar-se-á de um volume definido por personagens fortes e alicerçado em alguns elementos que no tomo inicial não explorei assim tanto. Será nitidamente mais romântico e com uma intensidade psicológica superior.

O que é que a escrita trouxe à sua vida que não conseguiria ter de nenhuma outra maneira?
Esta é uma questão complicada. Considero-me um privilegiado, sobretudo se comparado com as outras pessoas da minha geração. Tenho uma ocupação paralela de que gosto bastante e agora também a escrita, que é algo muito pessoal para mim. Talvez seja isso, a realização pessoal. Sinto que estou a fazer algo meu, mas que posso partilhar com os outros. E o valor de tal é inestimável.

Muito obrigada ao Nuno pela sua simpatia e disponibilidade!

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3 comentários:

  1. Como é que uma pessoa muito mais nova do que eu leu as mesmas coleções e frequentou a mesma biblioteca itenerante?! Eu tinha de esperar 4 semanas para que a carrinha da Gulbenkian passasse, mas, em contrapartida, os senhores que a geriam deixavam-me escolher os livros. Decididamente tenho de ler este livro nas férias do verão para depois ver a que faixa etária o possa aconselhar. Já agora, meninas, será que ele leu as aventuras do Langelot? Se não leu, aconselhem-nas. Eu continuo fã!!!

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    Respostas
    1. Mãe! Não me lembres do Langelot! Que saudades! Apesar de o meu género ser o romance/policial ou romance/histórico, o langelot foi uma série que fez parte da minha adolescência e que conheci apenas graças a ti. Isto porque, na verdade, já ninguém lê Langelot.. pena! Um adolescente espião super inteligente, giro e esperto? Quem resiste?

      (Roberta)

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  2. Não sendo eu uma leitora assídua deste género, desde que vi a capa a deambular pelas redes sociais que o comecei a procurar. Não tive sucesso! Esgotado em todo o lado. Sempre que ía a uma livraria, lá estava eu a perguntar pelo Nuno Nepomuceno... "Nuno Nepomuceno... Sim... Nepomuceno! É isso!"
    "Não menina, não temos!"
    Quando fui ao encontro a Lisboa no dia 18 de Fevereiro estava muito triste por saber que o Nuno lá estaria e eu sem livro dele para assinar. Apesar de tudo, eu e a Mariana ganhámos coragem, e começamos a falar com ele. BOLAS! Fiquei com mais vontade ainda de ler o Espião Português! NÃO ERA JUSTO!
    Mariana... estás convocada para uma vinda a Coimbra. Se não nos encontramos nos próximos tempos eu arranco os cabelos!
    QUERO CONHECER O ANDRÉ!!!!

    Obrigada Nuno pela disponibilidade, pelo seu trabalho, e pela forma como tem acedido aos nossos pedidos! Desejo-lhe sinceramente muito sucesso!

    Roberta Frontini

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